continuação 3

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que pude e segui seu exemplo sem muito entusiasmo. Comemos em silêncio
por um momento. Charlie ainda olhava as notícias, então peguei meu exemplar
muito surrado de O morro dos ventos uivantes de onde deixara naquela manhã
e tentei me perder na Inglaterra da virada do século enquanto esperava
que ele começasse a falar.
Eu estava na parte em que Heathcliff volta quando Charlie deu um pigarro
e atirou o jornal no chão.
— Você tem razão — disse Charlie. — Eu tinha um motivo para fazer
isso. — Ele agitou o garfo para a gororoba. — Queria conversar com
você.
Deixei o livro de lado.
— Podia simplesmente ter falado.
Ele assentiu, as sobrancelhas se unindo.
— É. Vou me lembrar disso da próxima vez. Pensei que tirar o jantar de
suas mãos amoleceria você.
Eu ri.
— Funcionou... Suas habilidades culinárias me deixaram mole feito marshmallow.
Do que você precisa, pai?
— Bom, é sobre Jacob.
Senti meu rosto enrijecer.
— O que tem ele? — perguntei por entre os lábios rígidos.
— Calma, Bells. Sei que ainda está chateada por ele ter delatado você, mas
foi a atitude certa. Ele estava sendo responsável.
— Responsável — repeti com sarcasmo, revirando os olhos. — Muito
bem, então, o que tem Jacob?
A pergunta despreocupada que se repetiu em minha cabeça era tudo,
menos banal. O quem tem Jacob? O que eu ia fazer com ele? Meu ex-melhor
amigo que agora era... o quê? Meu inimigo? Eu me encolhi.
A expressão de Charlie de repente era de preocupação.
— Não fique chateada comigo, está bem?
— Chateada?
— Bom, é sobre Edward também.
Meus olhos se estreitaram.
A voz de Charlie ficou mais ríspida.
— Eu o deixo entrar aqui em casa, não é?
— Deixa mesmo — admiti. — Por períodos curtos de tempo. É claro
que você também podia me deixar sair de casa por períodos curtos de vez em
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quando — continuei, só de brincadeira; eu sabia que ficaria trancafiada aqui
por todo o ano letivo. — Tenho sido muito boazinha ultimamente.
— Bom, era aí que eu ia chegar... — E, então, o rosto de Charlie se esticou
num sorriso inesperado que fez rugas nos olhos; por um segundo ele
parecia vinte anos mais novo.
Eu vi um brilho fraco de possibilidade naquele sorriso, mas continuei,
devagar.
— Estou confusa, pai. Está falando de Jacob, de Edward ou de meu castigo?
O sorriso faiscou de novo.
— Mais ou menos dos três.
— E qual é a relação entre eles? — perguntei, cautelosa.
— Tudo bem. — Ele suspirou, erguendo as mãos como se estivesse se
rendendo. — Estou pensando que talvez você mereça uma condicional por
bom comportamento. Para uma adolescente, você reclama muito pouco.
Minha voz e as sobrancelhas se ergueram.
— É sério? Estou livre?
De onde vinha isso? Eu tinha certeza de que ficaria em prisão domiciliar
até que realmente me mudasse, e Edward não captara nenhuma oscilação nos
pensamentos de Charlie...
Charlie ergueu um dedo.
— Sob uma condição.
O entusiasmo desapareceu.
— Ótimo — suspirei.
— Bella, isto é mais um pedido do que uma ordem, está bem? Você está
livre. Mas espero que vá usar a liberdade... com critério.
— O que isso quer dizer?
Ele suspirou de novo.
— Sei que está satisfeita por ficar o tempo todo com Edward...
— Também fico com Alice — interrompi. A irmã de Edward não tinha
hora de visita; entrava e saía quando bem entendia. Charlie era massa de
modelar nas mãos eficientes de Alice.
— Isso é verdade — disse ele. — Mas você tem outros amigos além dos
Cullen, Bella. Ou tinha, antigamente.
Nós nos olhamos por um longo momento.
— Quando foi a última vez que você falou com Angela Weber? — atirou
ele para cima de mim.
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— Na sexta-feira, no almoço — respondi de imediato.
Antes da volta de Edward, meus amigos da escola se polarizaram em
dois grupos. Eu preferia pensar neles como os bons e os maus. Nós e eles
também funcionava. Os bons eram Angela, o namorado firme dela, Ben
Cheney, e Mike Newton; estes três me perdoaram de modo generoso por
ter enlouquecido quando Edward foi embora. Lauren Mallory era o núcleo
mau do lado deles, e quase todos os outros, inclusive minha primeira amiga
em Forks, Jessica Stanley, pareciam satisfeitos em continuar no programa
anti-Bella.
Com Edward de volta à escola, a linha divisória ficara ainda mais distinta.
A volta de Edward cobrara seu tributo sobre a amizade de Mike, mas Angela
era inabalavelmente fiel, e Ben seguia seu exemplo. Apesar da aversão
natural que sentiam pelos Cullen, Angela se sentava por educação ao lado de
Alice todo dia no almoço. Depois de algumas semanas, Angela até parecia à
vontade ali. Era difícil não se encantar com os Cullen — depois que eles lhe
dessem a chance de ficar encantado.
— Fora da escola? — perguntou Charlie, recuperando minha atenção.
— Eu não vejo ninguém fora da escola, pai. De castigo, lembra? E Angela
tem namorado também. Ela sempre está com o Ben. Se eu fosse mesmo livre
— acrescentei, cheia de ceticismo —, talvez pudéssemos sair juntos.
— Tudo bem. Mas então... — ele hesitou. — Você e Jake costumavam
ser como unha e carne, e agora...
Eu o interrompi.
— Pode dizer aonde quer chegar, pai? Qual é sua condição... exatamente?
— Não acho que você deva abandonar todos os seus outros amigos por
causa de seu namorado, Bella — disse ele numa voz severa. — Não é bom,
e acho que sua vida será mais equilibrada se você tiver outras pessoas nela.
O que aconteceu em setembro...
Eu me encolhi.
— Bom — disse ele, na defensiva. — Se você tivesse uma vida à parte de
Edward Cullen, poderia não ter sido daquele jeito.
— Teria sido exatamente igual — murmurei.
— Talvez sim, talvez não.
— E então? — lembrei a ele.
— Use sua nova liberdade para ver seus outros amigos também. Tenha
equilíbrio.
Assenti devagar.

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