continuação 1

by - 13:47

para tocá-la. Ela imitou o movimento com exatidão, espelhando-o. Mas
onde nossos dedos deveriam se encontrar não havia nada, a não ser o vidro
frio...
Com um sobressalto vertiginoso, meu sonho tornou-se abruptamente um
pesadelo.
Não havia vovó alguma.
Aquela era eu. Eu em um espelho. Eu — anciã, enrugada e murcha.
Edward estava a meu lado, sem refl exo, lindo de morrer e com 17 anos
para sempre.
Ele apertou os lábios perfeitos e gelados em meu rosto desgastado.
— Feliz aniversário — sussurrou.
Acordei assustada — minhas pálpebras se arregalando — e arfante. A luz
cinzenta e embaçada, a familiar luz de uma manhã nublada, tomou o lugar
do sol ofuscante de meu sonho.
Um sonho, disse a mim mesma. Foi só um sonho. Respirei fundo e pulei novamente
quando meu despertador tocou. O pequeno calendário no canto do
mostrador do relógio me informou que era dia 13 de setembro.
Um sonho, mas pelo menos, de certo modo, bastante profético. Era o dia
do meu aniversário. Eu tinha ofi cialmente 18 anos.
Durante meses, tive pavor desse dia.
Por todo o verão perfeito — o verão mais feliz que tive na vida, o verão
mais feliz que qualquer um em qualquer lugar teria e o verão mais chuvoso da
história da península de Olympic — essa triste data fi cou de tocaia, esperando
para saltar sobre mim.
E, agora que chegara, era ainda pior do que eu temia. Eu podia sentir —
eu estava mais velha. A cada dia eu fi cava mais velha, mas isto era diferente,
era pior, quantifi cável. Eu tinha 18 anos.
E Edward jamais teria essa idade.
Quando fui escovar os dentes, quase me surpreendi com o fato de que
o rosto no espelho não mudara. Olhei para mim mesma, procurando por
algum sinal de rugas iminentes em minha pele de marfi m. Mas os únicos
vincos eram os da minha testa, e eu sabia que, se conseguisse relaxar, eles desapareceriam.
Não consegui. Minhas sobrancelhas se alojaram em uma linha
de preocupação acima de meus angustiados olhos castanhos.
Foi só um sonho, lembrei a mim mesma de novo. Só um sonho... Mas também
meu pior pesadelo.
 15 
Não tomei o café-da-manhã, com pressa para sair de casa o mais rápido
possível. Não fui inteiramente capaz de evitar meu pai e tive de passar alguns
minutos fingindo-me animada. Tentei fi car empolgada de verdade com
os presentes que eu pedira que ele não comprasse para mim, mas sempre que
eu tinha de sorrir, parecia que podia começar a chorar.
Lutei para me controlar enquanto dirigia para a escola. A visão de minha
avó — eu não pensava nela como eu mesma — não saía de minha cabeça. Só o
que consegui sentir foi desespero, até que parei no estacionamento conhecido
atrás da Forks High School e vi Edward curvado e imóvel sobre seu Volvo
prata polido, como um monumento de mármore em homenagem a algum
esquecido deus pagão da beleza. O sonho não lhe fizera justiça. E ele esperava
ali por mim, exatamente como nos outros dias.
O desespero desapareceu por um momento, substituído pela admiração.
Mesmo depois de meio ano com ele, eu ainda não acreditava que merecia
tanta sorte.
Sua irmã, Alice, estava a seu lado, também esperando por mim.
É claro que Edward e Alice não eram de fato parentes (em Forks, corria a
história de que todos os irmãos Cullen tinham sido adotados pelo Dr. Carlisle
Cullen e sua esposa, Esme, os dois indiscutivelmente novos demais para
ter fi lhos adolescentes), mas sua pele tinha exatamente a mesma palidez, os
olhos tinham o mesmo tom dourado, com as mesmas olheiras fundas, como
hematomas. O rosto de Alice, como o dele, era de uma beleza incrível. Para
alguém que sabia — alguém como eu —, essas semelhanças representavam
a marca do que eles eram.
A visão de Alice esperando ali — seus olhos caramelo brilhantes de empolgação
e um pequeno embrulho prateado nas mãos — deixou-me carrancuda.
Eu disse a Alice que não queria nada, nada mesmo, nenhum presente,
nem mesmo alguma atenção pelo aniversário. Obviamente, meus desejos
estavam sendo ignorados.
Bati a porta de minha picape Chevy 53 — uma chuva de ferrugem caiu
do teto molhado — e andei devagar na direção deles. Alice pulou à frente
para me receber, a cara de fada reluzente sob o cabelo preto e desfi ado.
— Feliz aniversário, Bella!
— Shhh! — sibilei, olhando o estacionamento para me certifi car de que
ninguém a ouvira. A última coisa que eu queria era uma espécie de comemoração
do melancólico evento.
Ela me ignorou.
 16 
— Quer abrir seu presente agora ou depois? — perguntou ansiosamente
enquanto seguíamos para onde Edward ainda esperava.
— Nada de presentes — protestei num murmúrio.
Ela por fi m pareceu entender meu estado de espírito.
— Tudo bem... Mais tarde, então. Gostou do álbum que sua mãe mandou
para você? E a câmera de Charlie?
Suspirei. É claro que ela saberia quais eram meus presentes de ani ver sário.
Edward não era o único membro da família com habilidades in co muns. Alice
teria “visto” o que meus pais planejavam assim que eles toma ram a decisão.
— É. São ótimos.
— Eu acho que é uma ótima idéia. Só se chega ao último ano da escola
uma vez. Pode muito bem documentar a experiência.
— Quantas vezes você fez o último ano?
— Isso é diferente.
Chegamos então perto de Edward e ele estendeu a mão para mim. Eu
a peguei ansiosa, esquecendo-me, por um momento, de meu mau humor.
Sua pele, como sempre, era suave, dura e muito fria. Ele apertou meus dedos
com delicadeza. Olhei em seus claros olhos de topázio e meu coração
sentiu um aperto não tão delicado. Ouvindo meu coração vacilar, ele sorriu
de novo.
Ele ergueu a mão livre e, ao falar, acompanhou o contorno de meus lábios
com a ponta do dedo frio.
— E então, como discutimos, não tenho permissão para lhe desejar um
feliz aniversário, é isso mesmo?
— É. É isso mesmo. — Eu não conseguia imitar o ritmo de sua pronúncia
perfeita e formal. Era algo que só poderia ter sido adquirido em um século
anterior.
— Só estou verifi cando. — Ele passou a mão no cabelo desgrenhado cor
de bronze. — Você bem que podia ter mudado de idéia. A maioria das pessoas
parece gostar de aniversários e presentes.
Alice riu e o som era todo prata, um sino de vento.
— É claro que você vai gostar. Todo mundo deve ser gentil com você hoje
e fazer suas vontades, Bella. Qual é a pior coisa que pode acontecer? — Sua
pergunta era retórica.
— Ficar mais velha — ainda assim respondi, e minha voz não era tão
estável como eu queria que fosse.
A meu lado, o sorriso de Edward se estreitou em uma linha rígida.
 17 
— Dezoito anos não é muito velha — disse Alice. — Em geral as mulheres
não esperam até ter 29 para se aborrecer com os aniversários?
— É mais do que Edward — murmurei.
Ele suspirou.
— Tecnicamente — disse ela, mantendo o tom leve. — Mas só por um
ano.
E eu imaginei... Se eu pudesse ter certeza do futuro que queria, certeza de
que passaria a eternidade com Edward, Alice e os demais Cullen (de preferência
não como uma velhinha enrugada)... Então um ou dois anos a mais ou
a menos não me importariam tanto. Mas Edward era rigorosamente contra
qualquer futuro que me alterasse. Qualquer futuro que me tornasse igual a
ele — que me tornasse imortal também.
Um impasse, ele tinha dito.
Para ser franca, eu não conseguia entender o argumento de Edward. O
que havia de tão bom na mortalidade? Ser um vampiro não parecia tão terrível
— não como faziam os Cullen, pelo menos.
— A que horas você vai estar em casa? — continuou Alice, mudando de
assunto. A julgar por sua expressão, ela estava aprontando exatamente o tipo
de coisa que eu esperava evitar.
— Não sei se vou para casa.
— Ah, por favor, Bella! — reclamou ela. — Não vai estragar toda a nossa
diversão desse jeito, vai?
— Pensei que no meu aniversário eu pudesse fazer o que eu quisesse.
— Eu vou apanhá-la em casa logo depois da escola — disse-lhe Edward,
ignorando-me completamente.
— Tenho que trabalhar — protestei.
— Na verdade, não tem — disse-me Alice, convencida. — Já falei com a
Sra. Newton sobre isso. Ela vai trocar seus turnos. E me pediu para lhe dizer
“Feliz aniversário”.
— E-eu ainda não posso ir — gaguejei, procurando uma desculpa. — Eu,
bom, ainda não vi Romeu e Julieta para a aula de inglês.
Alice bufou.
— Você conhece Romeu e Julieta de cor.
— Mas o Sr. Berty disse que precisávamos ver uma representação para
apreciá-lo plenamente... Era o que Shakespeare pretendia.
Edward revirou os olhos.
— Você já viu o fi lme — acusou Alice.
 18 
— Mas não a versão dos anos 60. O Sr. Berty disse que era a melhor.
Por fi m, Alice perdeu o sorriso presunçoso e me fi tou.
— Isso pode ser fácil ou pode ser difícil, Bella, mas de uma forma ou de
outra...
Edward interrompeu sua ameaça.
— Relaxe, Alice. Se Bella quer ver um fi lme, então pode ver. É o aniversário
dela.
— Viu? — acrescentei.
— Vou levá-la por volta das sete — continuou ele. — Isso lhe dará bastante
tempo para preparar tudo.
O riso de Alice repicou de novo.
— Parece ótimo. Nos vemos à noite, Bella! Vai ser divertido, você verá.
Ela sorriu com malícia — o sorriso largo expôs todos os dentes perfeitos
e reluzentes —, depois me deu um beliscão na bochecha e desapareceu para
sua primeira aula antes que eu pudesse responder.
— Edward, por favor... — comecei a pedir, mas ele colocou um dedo frio
em meus lábios.
— Discutiremos isso mais tarde. Vamos nos atrasar para a aula.
Ninguém se incomodou em olhar para nós enquanto assumíamos nossos
lugares de sempre no fundo da sala (agora assistíamos a quase todas as aulas
juntos — eram incríveis os favores que Edward conseguia que as mulheres
da secretaria fi zessem para ele). Edward e eu estávamos juntos havia tempo
demais para ainda sermos objeto de fofoca. Nem Mike Newton se incomodava
mais em me lançar o olhar de mau humor que antigamente me fazia sentir
meio culpada. Ele agora sorria, e fi quei feliz por ele parecer ter aceitado que
podíamos ser só amigos. Mike mudara no verão — estava menos rechonchudo,
as maçãs do rosto mais proeminentes e o cabelo louro-claro estava
diferente; em vez de arrepiado, estava mais comprido e com gel, em uma
desordem cuidadosamente casual. Era fácil ver de onde vinha sua inspiração
— mas o visual de Edward não era algo que se pudesse imitar.
À medida que o dia avançava, pensei em maneiras de me livrar do que
quer que estivesse para acontecer na casa dos Cullen à noite. Já seria bem
ruim ter de comemorar quando meu humor era colocar luto. Mas, pior do
que isso, aquilo, com certeza, envolveria atenção e presentes.
Nunca é bom ter atenção, como concordaria qualquer outro desajeitado
com tendência a sofrer acidentes. Ninguém quer um refl etor sobre si quando
é provável que vá cair de cara no chão.
 19 
E eu insisti — bom, na verdade ordenei — que ninguém me desse nenhum
presente este ano. Aparentemente, Charlie e Renée não foram os únicos
que decidiram ignorar isso.
Nunca tive muito dinheiro, e isso nunca me incomodou. Renée me criou
com salário de professora de jardim-de-infância. Charlie também não ia enriquecer
com seu emprego — ele era o chefe de polícia daqui, da cidadezinha
de Forks. Minha única renda vinha dos três dias da semana em que eu trabalhava
na loja de artigos esportivos da cidade. Em uma cidade tão pequena, eu
tinha sorte por ter um emprego. Cada centavo que ganhava ia para meu microscópico
fundo de universidade. (A universidade era o Plano B. Eu ainda
esperava pelo Plano A, mas Edward teimava tanto em me deixar humana...)
Edward tinha muito dinheiro — eu nem queria pensar em quanto. O
dinheiro não signifi cava quase nada para ele e para os demais Cullen. Era
só algo que se acumulava quando se tinha tempo ilimitado nas mãos e uma
irmã com uma capacidade misteriosa de prever tendências no mercado de
ações. Edward não parecia entender por que eu fazia objeção a ele gastar
dinheiro comigo — por que me deixava pouco à vontade quando me levava
a um restaurante caro em Seattle, por que não podia comprar para mim um
carro que pudesse atingir mais de 90km/h, ou por que eu não deixaria que
ele pagasse os custos da minha universidade (ele era ridiculamente entusiasmado
com o Plano B). Edward pensava que eu estava sendo difícil sem
necessidade.
Mas como eu podia deixar que ele me desse presentes quando eu não tinha
nada para dar em troca? Ele, por algum motivo insondável, queria fi car
comigo. Qualquer coisa que me desse além disso só aumentava ainda mais
as diferenças entre nós.
Com o passar do dia, nem Edward nem Alice voltaram a comentar o tema
de meu aniversário, e eu comecei a relaxar um pouco.
Nós nos sentamos à nossa mesa de sempre no almoço.
Havia uma espécie estranha de trégua naquela mesa. Nós três — Edward,
Alice e eu — sentávamos no extremo sul da mesa. Agora que os irmãos Cullen
mais “velhos”, e de certa forma mais assustadores (no caso de Emmett,
certamente), tinham se formado, Alice e Edward não pareciam intimidar
tanto e não nos sentávamos sozinhos. Meus outros amigos — Mike e Jessica
(que estavam na estranha fase de amizade pós-término), Angela e Ben
(cuja relação sobreviveu ao verão), Eric, Conner, Tyler e Lauren (embora esta
última não contasse de fato na categoria amizade) — sentavam-se à mesma

You May Also Like

0 comentários